"Gente Sem Crédito Que Apenas Sabe Debitar"

Nada mais perigoso que um bom tribuno oco
Debita oratória na inversa razão de saber tão pouco
Nada mais perigoso quando se julga em crédito
Vai insuflando em si o providencial dom do inédito

Mas tudo o que apenas contém ar um dia se esvai
À velocidade inversa da falta de rumo e razão
E essa gente, que nada mais sabe, alapa-se e não se vai

Mesmo se a falta de vergonha se torna visita de rotina
Ainda que os insultem continuamente ou lhes deixem de passar cartão
Arregimentam-se na soberba de propaganda de única sina
Tornando-se lapas matracas escondidas atrás de um cobarde bastão

Julgam assim moer a inteligência do mexilhão
Levando-o ao desespero pela falta de maré renovada
Incutem-lhe o medo da troca de rocha erodida por alçapão
Como quem castiga os que alguma coisa sabem e ousam dizer não
Pelo fel do rancor de saberem nunca virem a saber realmente nada

E, quando, como peixe balão podre rebentam
E soltam no ar todo o fedor de banha da cobra
Entrincheiram-se nas tocas fugindo dos que já não aguentam
O insuportável peso do fardo que tudo lhes dobra

Mas quando o limite da dor já não fizer doer
Pois os cavacos, que não só os dos açores, apenas se curvam às lapas
Os desacreditados vermes moluscos não mais se poderão esconder

E por muito que debitem, depois de tudo nos terem procurado debitar
E ainda que procurem abrigo noutro oceano de peixe miúdo
Entoando idêntico ardil para de novo encimar a cadeia alimentar
Descobrirão que a voz das sardinhas a quem chuparam tudo
Gravou na corrente de todos os mares o aviso lapidar
Que os tubarões também usam vestes de lapa
E as outras sardinhas munir-se-ão de rede e anzol para filtrar
O descrédito dos que nada pescam senão o saber debitar
Sem sombra de vergonha, sensibilidade, competência e qualquer espécie de lata