“O Machado Que Surpreenderá A Ceifeira”
Há momentos em que, embora como se quase o pressentíssemos, somos confrontados com inevitáveis imprevistos, incontroláveis e intratáveis. Não há forma de saber quando, mas sabemos que virão. Nem precisam ser próprios, ao invés até seriam por vezes mais toleráveis, para sentirmos um forte abalo na estrutura emocional, mesmo se já estabilizada depois de superados outros factos não tão imprevistos, eventualmente evitáveis, mas igualmente tão inevitáveis. Basta, e se basta, serem imprevistos que tocam em jeito de lenta ceifeira o ombro dos que nos são muito próximos. É nestes instantes de surpresa, que quase nos anestesiam, que importa, por muito que doam as perspectivas, manter acordado o presente e deixar adormecer o futuro. O futuro será longo se encarado como cada sopro do presente em que nos levantamos, não evitamos o esquecimento, controlamos as emoções e tratamos de preparar o espirito para o combate da demência que a ceifeira nos quer incutir na clarividência. E o futuro começa hoje e eu vou estar a olhar de cima e com desdém, robusto, para o que nos quer roubar os que mais amamos. E, em cada dia, serei eu que tocarei, de forma que lhe será sempre imprevista, no ombro da ceifeira e lhe direi ainda não, ainda não.